terça-feira, 20 de abril de 2010

Caso clínico 04

Uma mulher de 47 anos vem à emergência com dor torácica, palpitações, sudorese, náuseas e vômitos depois de um "banho quente". ECG na admissão mostra taquicardia ventricular intermitente de complexo QRS alargado, e ECGs seriados mostraram elevação do segmento ST em parede inferior. Após tratamento trombolítico com tenecteplase, foi iniciada infusão de amiodarona. Foi transferida para hospital cardiológico por dor torácica contínua e hipotensão.

Evoluiu para choque cardiogênico, com acidose láctica grave e edema pulmonar, necessitando de intubação traqueal, ventilação mecânica e suporte inotrópico. Tinha extenso livedo reticularis em MMII.

Coronariografia de emergência foi realizada e mostrou artérias coronárias amplamente patentes. A angiografia do ventrículo esquerdo mostrou grave disfunção sistólica de VE com hipocinesia generalizada, que foi relativamente pior em segmento médio de parede de VE, em comparação com segmentos apical e basal. Também apresentou insuficiência mitral grave com altas pressões de enchimento diastólico de VE. Balão intra-aórtico foi inserido para estabilização hemodinâmica.

Há relato de um evento semelhante, mas menos grave, três anos antes, quando a paciente apresentou uma elevação do segmento ST, que foi tratado com trombólise, sendo posteriormente liberada após um coronariografia normal.

No dia seguinte ao do choque cardiogênico, foi extubada e transferida da UTI para Unidade coronariana. USG foi solicitada por alteração na função hepática e mostrou a seguinte imagem:



QUESTÕES:

1. Qual a causa provável do quadro desta paciente?

2. Como confirmar o diagnóstico?

3. Como tratar a condição?

3 comentários:

Taciana disse...

1. Feocromocitoma.
2. Dosagem de metanefrinas urinárias.
3. Ressecção cirúrgica, de preferência após 2 semanas de uso de bloqueadores alfa-adrenérgicos (redução da vasoconstricção sistêmica e redução de riscos e hipotensão após remoção da neoplasia).

Vander disse...

A presença de imagem em topografia de adrenal, associada aos achados clínicos de palpitações + sudorese devem orientar a suspeita para Feocromocitoma. Embora aqui não esteja presente a tríade clássica (cefaléia + palpitações + sudorese profusa), a presença de apenas dois dos sintomas existe na maioria dos pacientes com feocromocitoma, e em número muito pequeno de pacientes sem o tumor. Chama a atenção ainda a presença de isquemia cardíaca sem oclusão coronariana, neste caso atribuída ao aumento da demanda miocárdica de O2 consequente aos níveis elevados de catecolaminas. Feocromocitoma é um tumor secretor de catecolaminas, que pode aparecer esporadicamente ou como parte da neoplasia endócrina múltipla tipo 2. É uma das causas de hipertensão secundária a serem consideradas, responsável por cerca de 0,1% dos casos de HAS, e é potencialmente curável. A idade média ao diagnóstico é cerca de 40 anos. Importante considerar a "regra dos 10", que lembra que 10% dos tumores são bilaterais, 10% são extra-adrenais e 10% são malignos. A ideia de que a hipertensão é sempre paroxística tem caido em descrédito, visto que estudos recentes mostram que até 50% dos pacientes com feocromocitoma apresentam-se clinicamente indistinguíveis daqueles com HAS essencial. O diagnóstico é realizado por meio do achado laboratorial do excesso de catecolaminas, junto com documentação radiográfica do tumor. O teste laboratorial que apresenta maior sensibilidade e especificidade é a dosagem de metanefrinas em urina de 24h, mas a dosagem de metanefrinas livres no plasma também tem boa acurácia. TC com contraste e RNM com gadolínio tem a mesma sensibilidade para o diagnóstico. Naqueles 10% de casos de tumor extra-adrenal, pode ser útil a cintilografia com metaiodobenzilguanidina. O objetivo terapêutico é a remoção completa do tumor. Para um procedimento seguro, é necessário um preparo medicamentoso iniciado cerca de 14 dias antes do procedimento, com bloqueadores adrenérgicos alfa (fenoxibenzamina: dose final 20-30mg 3x/dia) e beta (ex. propranolol 10mg 3-4x/dia).

Em suma:

1. Feocromocitoma.

2. Dosagem de metanefrinas em urina de 24h + TC com contraste (ou RNM com gadolínio).

3. Remoção cirúrgica do tumor, após preparo medicamentoso (uso de bloqueadores alfa e beta-adrenérgicos 2 semanas antes do procedimento).

Vander disse...

Fontes:

"Treatment of pheochromocytoma in adults" in UpToDate version 17.3

"Clinical presentation and diagnosis of pheochromocytoma" in UpToDate version 17.3

"Pheochromocytoma" in Harrison's Principles of Internal Medicine 17th edition